A ligação entre a música e a língua em Cabo Verde é tema de uma pesquisa de doutoramento que está sendo desenvolvida numa das maiores universidades do mundo - Harvard. O trabalho, que abrange a área de antropologia, sociolinguística e música, está sendo desenvolvido pela norte-americana Carla Martin que conheceu Cabo Verde em 2003. Entretanto, diz que, na sua adolescência conviveu muito com cabo-verdianos naquele país, já o crioulo propriamente dito surgiu no seu percurso em 2002 na Universidade de Harvard.
A pesquisa abrange também a língua crioula, em todas as variantes, e sua valorização na música - " uma música muito rica que fez Cabo Verde atravessar o mundo inteiro, numa língua pouco conhecida e falada", diz. Quando veio para Cabo Verde em 2003, Carla ficou um ano na Praia vivendo com uma família da ilha do Fogo. Desde aquela época sempre vem de ferias ao país e hoje fala um crioulo que deixa qualquer um na dúvida: Será que ela é natural da ilha do Fogo, de Santiago ou da Brava? Já que ela sempre conviveu com pessoas dessas ilhas e foi adaptando os sotaques. Entretanto, não acredita que se expressa muito bem na língua crioula e justifica "já posso expressar e escrever quase sem problemas, mas não me sinto fluente ainda".
Pesquisa
"Eu percebo que o português é muito usado em outros espaços em Cabo Verde, como na sua rica literatura. Já na música me parece ser sempre obrigatório o uso do crioulo. Assim, no meu trabalho questiono porque é que isso acontece e já tenho várias possíveis respostas: pode ser porque a língua materna expressa melhor a alma do cabo-verdiano, pode ser porque é a língua materna e as pessoas ficam mais a vontade usando-a ou então porque a música é um espaço seguro, onde o português não tem que ser usado", diz.
O crioulo também é visto pela pesquisadora como sendo um ponto, importante, para ligar Cabo Verde com a diáspora, já que a diáspora fala apenas crioulo, "tanto que para mim parece que os Estados Unidos já é outra ilha de Cabo Verde e as pessoas preferem até notícias escritas em crioulo ao invés de português, por exemplo". Pelo trabalho que ela vem desenvolvendo, a doutoranda percebe também que a língua materna do cabo-verdiano tem uma forte importância no desenvolvimento cultural do país.
O trabalho, também, abrange a Rádio Praia Fm, porque mais de 90% da produção da estação é feita em crioulo. Nesses anos de pesquisa ela diz que reparou que, de maneira geral, antes as rádios do país tocavam músicas feitas por americanos, brasileiros, portugueses e outros e hoje percebe uma inversão de valores, uma vez que a maior parte das músicas que tocam é de cabo-verdianos residentes no país ou na diáspora, em crioulo. Esse facto é considerado por Carla como uma excelente forma de promover o nacionalismo, através da língua.
Apesar de considerar cedo para tirar conclusões já que o trabalho só vai ser apresentado em 2011, Carla já pode dizer que o desenvolvimento do país vai continuar a passar pela música. E também que o crioulo é importante e indispensável para o desenvolvimento do arquipélago. E vai mais além " talvez pelo facto de o crioulo ser um espaço seguro para o cabo-verdiano, deveria-se aproveitar para usá-lo, também, no ensino em Cabo Verde e em outros espaços no país porque acredito que dará oportunidade para outras pessoas subirem o seu nível de vida".
A especialista está no país pela quinta vez e sempre faz questão de visitar mais de uma ilha e ilhas diferentes para conhecer os músicos do país e poder fazer uma análise sobre a diversidade cultural e musical que torna Cabo Verde um país rico.
A especialista está no país pela quinta vez e sempre faz questão de visitar mais de uma ilha e ilhas diferentes para conhecer os músicos do país e poder fazer uma análise sobre a diversidade cultural e musical que torna Cabo Verde um país rico.
Ensino do crioulo nos States
Nos Estados Unidos o crioulo é parte do currículo nos liceus, onde estudam cabo-verdianos. Assim, se alguém, seja ele cabo-verdiano ou não, quiser fazer a sua licenciatura na área de estudos cabo-verdianos ele tem que aprender o crioulo. Têm que fazer dois anos lectivos para se graduar na língua. Carla recorda que o "crioulo surgiu no currículo por causa de algumas professoras que valorizam muito a língua e a importância dela para o desenvolvimento dos estudantes cabo-verdianos e acabaram por criar o currículo bilingue para cabo-verdianos que emigravam para os Estados Unidos.
O interesse pela Morabeza crioula
"O meu interesse por Cabo Verde surgiu porque cresci com muitos amigos cabo-verdianos na zona de Bóston. Mas, mesmo assim, quando eu fui para a universidade eu não sabia quase nada sobre o arquipélago. Comprei o CD Café Atlântico, de Cesária Évora e gostei muito. Foi aí que propus investigar e conhecer mais sobre esse país que produz essa música tão boa, fui estudando, pesquisando, fiz aula de crioulo na Universidade de Massachusetts e fiz lá uma grande amiga cabo-verdiana, a Inês Brito, conhecida por Nezi Brito, que dá aulas de crioulo lá. Ela me convidou para vir para Cabo Verde e dar aulas de inglês". Foi assim que Carla veio para Cabo Verde e ficou vivendo na Praia, durante um ano, com a família de Nezi Brito.
"Fiquei com uma paixão grande pelo país porque conheci uma cultura rica diferente da minha e com uma grande Morabeza". Essa última palavra ela define assim: "Se andas na rua as pessoas te cumprimentam, cumprimentas, as pessoas te convidam para sair. Se vais à casa das pessoas elas te convidam para lanchar, almoçar é algo especial. Todos têm uma amizade para com o outro. Nos Estados Unidos, é uma correria, todos os dias, que nem dá tempo para ter essa Morabeza. Estamos muito ocupados e podemos passar uma semana sem ver os nossos amigos. Mas aqui é algo diferente, as pessoas dão mais importância a convivência". Explica o que sente.
Sodade é outra palavra que ela gosta e explica com o sentimento que sentiu quando ficou um ano em Cabo Verde longe da sua família biológica. "Sei o que é porque chorei e senti aquela vontade de estar perto da família. Mas acho que saudade da música é uma saudade muito mais forte em que as pessoas sentem uma nostalgia, falta do país, da família, da comida, de tudo o que estavam acostumadas antes de viverem fora. Acho que a música de Cabo Verde expressa muito bem essa Saudade", diz com uma certa melancolia que mais uma vez a confunde com uma cabo-verdiana da gema. A culinária cabo-verdiana é outra paixão da norte-americana que, inclusive já começou a aprender a confeccionar alguns pratos, como a cachupa, cuscus, e algumas sobremesas como doces que são a paixão da pesquisadora.
Sodade é outra palavra que ela gosta e explica com o sentimento que sentiu quando ficou um ano em Cabo Verde longe da sua família biológica. "Sei o que é porque chorei e senti aquela vontade de estar perto da família. Mas acho que saudade da música é uma saudade muito mais forte em que as pessoas sentem uma nostalgia, falta do país, da família, da comida, de tudo o que estavam acostumadas antes de viverem fora. Acho que a música de Cabo Verde expressa muito bem essa Saudade", diz com uma certa melancolia que mais uma vez a confunde com uma cabo-verdiana da gema. A culinária cabo-verdiana é outra paixão da norte-americana que, inclusive já começou a aprender a confeccionar alguns pratos, como a cachupa, cuscus, e algumas sobremesas como doces que são a paixão da pesquisadora.
16-11-2009, 20:27:15
VO, Expresso das Ilhas
Fonte: http://www.expressodasilhas.sapo.cv/noticias/detail/id/13027/
VO, Expresso das Ilhas
Fonte: http://www.expressodasilhas.sapo.cv/noticias/detail/id/13027/
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