29-05-09
Fonte: A SEMANA
Ao receber o convite para falar do tema, a minha primeira reacção foi a de declinar o pedido, por duas razões: 1º porque tinha pouco tempo disponível para a preparação da comunicação; 2º porque é um tema cuja reflexão não abunda em Cabo Verde e cuja prática, entre nós, é ainda muito incipiente.
Porém, reflectindo melhor, cheguei à conclusão que, numa altura em que o Ministério que dirijo defende e preconiza a elaboração de um estudo sobre a Economia da Cultura em Cabo Verde, não seria coerente da minha parte recusar um desafio que, justamente, poderia ser uma boa oportunidade de partilha e de interpelação sobre uma problemática de primeira actualidade e de suma importância para a estratégia de desenvolvimento em Cabo Verde.
Para a abordagem do tema, proponho quatro pontos:
a) A Inteligência do conceito Economia da Cultura; b) As características da Economia da Cultura em alguns países do mundo; c) A Economia da Cultura em Cabo Verde -potencialidades e Dificuldades; d) Desafios da Economia da Cultura em Cabo Verde.
Desejável seria que, após a incursão acima referida, houvesse um espaço de partilha e de debate com vista ao enriquecimento ou melhoramento do conteúdo exposto e da visão apresentada.
Desejável seria que, após a incursão acima referida, houvesse um espaço de partilha e de debate com vista ao enriquecimento ou melhoramento do conteúdo exposto e da visão apresentada.
I. O QUE É A ECONOMIA DA CUTURA?
Retomemos o primeiro ponto. Qual é o entendimento que hoje se tem da economia da cultura?
Antes de mais, há que reconhecer que, até aos anos 80 do século XX, a visão que se tinha do desenvolvimento era marcadamente economicista. O que interessava era sobretudo o crescimento, ficando a qualidade de vida, o equilíbrio ambiental e a integração sociocultural relegados muito abaixo do nível da razoabilidade.
Porém, alguns intelectuais, como o poeta e Presidente Leopold Sédar Senghor, vinham pregando, quase que no deserto, que «la culture est au début et à la fin du développement».
A partir dos anos 80, a cultura, como factor de desenvolvimento, começou a fazer escola através do próprio Banco Mundial que começou a defender que todo o projecto de desenvolvimento que não tivesse a preocupação de estar integrado no ambiente sócio cultural estaria votado ao fracasso.
Hoje, em 2009, o reconhecimento do valor estratégico da cultura para o desenvolvimento é cada vez mais consensual. Há mesmo uma forte corrente que advoga que a cultura, juntamente com o conhecimento, é uma das principais fontes de empoderamento dos povos. Segundo o Relatório sobre a situação da População Mundial 2008, das Nações Unidas, «A cultura é uma fonte do conhecimento, da identidade e do poder».
É com esta nova visão sobre o papel da cultura que a problemática» Economia da Cultura» ganha conteúdo e sentido.
Segundo o brasileiro Sérgio Sá Leitão «a expressão economia da cultura identifica o conjunto de actividades económicas relacionadas com a cultura.»
Assim, para haver economia da cultura têm que haver sujeitos culturais que criam ou reproduzem, tem que haver produtos culturais criados ou reproduzidos; tem que haver mercado de transacção; tem que haver retorno económico para a satisfação das necessidades dos sujeitos culturais e para reforçar o investimento no sector.
Na economia da cultura tem que haver a relação entre a criação, a reprodução e o mercado em todos os domínios das indústrias criativas como: o audiovisual, as edições de livros e jornais, a música (nas suas variadas expressões ou manifestações), o teatro, a dança, as artes plásticas, a fotografia, o artesanato, a moda, os concursos de beleza, a gastronomia, a publicidade, o design, o entretenimento, os festivais, as festas populares ou tradicionais, o produto cultural na comunicação social, os pacotes culturais para o turismo, a investigação e o magistério culturais etc, etc.
Segundo o brasileiro Sérgio Sá Leitão «a expressão economia da cultura identifica o conjunto de actividades económicas relacionadas com a cultura.»
Assim, para haver economia da cultura têm que haver sujeitos culturais que criam ou reproduzem, tem que haver produtos culturais criados ou reproduzidos; tem que haver mercado de transacção; tem que haver retorno económico para a satisfação das necessidades dos sujeitos culturais e para reforçar o investimento no sector.
Na economia da cultura tem que haver a relação entre a criação, a reprodução e o mercado em todos os domínios das indústrias criativas como: o audiovisual, as edições de livros e jornais, a música (nas suas variadas expressões ou manifestações), o teatro, a dança, as artes plásticas, a fotografia, o artesanato, a moda, os concursos de beleza, a gastronomia, a publicidade, o design, o entretenimento, os festivais, as festas populares ou tradicionais, o produto cultural na comunicação social, os pacotes culturais para o turismo, a investigação e o magistério culturais etc, etc.
O leque da economia da cultura é deveras abrangente. Ela promove o desenvolvimento, cria emprego, aumenta a qualidade de vida e, no dizer de Olavo Correia, citando Adam Smith e David Ricardo, «ela cria, através da arte, externalidades positivas, isto é, produz efeito benéfico na economia de outras actividades das quais o turismo é o caso mais evidente».
A economia da cultura revela apenas uma face da cultura. A outra face, a mais importante, seguramente, é simbólica, é identitária. É esta segunda face da cultura que confere singularidade e personalidade a um povo e a uma nação.
Todo o povo que tenha uma rica identidade cultural e uma indústria cultural dinâmica e criativa tem também, seguramente, um forte desenvolvimento, com crescimento, com qualidade de vida e com equilíbrio ambiental.
Será que Cabo Verde tem uma rica identidade cultural e uma indústria cultural dinâmica e criativa? Daremos resposta no terceiro ponto da nossa exposição. Por enquanto, debrucemo-nos sobre o segundo ponto que é :
II. AS CARACTERÍSTICAS DA ECONOMIA DA CULTURA NO MUNDO.
Consultando alguns dados disponíveis na Internet, fiquei rendido diante do potencial das indústrias criativas, em alguns países do planeta.
Desde logo, pude constatar, que a nível mundial, a economia da cultura representou uma média de 7% do PIB, em 2003 e que hoje, esta percentagem está à volta dos 10%.
Verifiquei ainda que, se a taxa média de crescimento da economia mundial é de 5%, a da economia da cultura é de 6%. Sabe-se que, na Europa, a economia da cultura representa 2,6% do PIB. Em França representa mais do que 3%, e em Portugal a percentagem é de 1,4%, quando o sector imobiliário representa apenas 0,6% do PIB em Portugal.
Continuando a minha pesquisa descobri: • que de 2000 a 2001, na Dinamarca, a economia da cultura contribuiu com 5,3% do PIB; representou um volume de negócios da ordem dos 23.4 biliões de Euros; proporcionou 170.000 postos de trabalho (full Time); representou 16% do total das exportações num montante de 9.11 milhões de euros. . Que no Reino Unido, em 2001, a economia da cultura contribuiu com 6.8% do PIB,. Representou um volume de negócios de 165.43 biliões de euros; proporcionou 1.3 milhões de postos de trabalho, representou 4.7 das exportações num montante de 15.1 biliões de euros. • Que na Suécia, de 200-2001, a economia da cultura contribui com 9% do PIB; representou um volume de negócios da ordem de 17.1 biliões de euros; proporcionou 400.000 postos de trabalhos;
Uma fonte credível informou-me que a economia da cultura nos EUA tem muito mais peso do que a própria indústria de automóvel.
Não há dúvida de que os dados referidos são indicadores do potencial económico que a economia da cultura hoje representa no mundo.
A questão que fica no ar é se em Cabo Verde a economia da cultura pesa no nosso PIB e se já tomámos consciência que ela, efectivamente, pode ser o nosso ouro e o nosso diamante.
III A ECONOMIA DA CULTURA EM CABO VERDE: POTENCIALIDADES E DESAFIOS.
Já dissemos que a economia da cultura exige o sujeito cultural, o produto cultural e o mercado da arte. O sujeito cultural tem que ter talento, tem que ter qualificação. Este mesmo sujeito precisa de incentivos, de meios e de condições para criar ou para comunicar a sua arte. Para além da formação, ele deve contar com uma forte organização, capaz de negociar com o mercado e de organizar os pacotes promocionais, ocupar-se do marketing e da publicidade, sensibilizar e convencer os patrocinadores públicos e privados, organizar e garantir o cumprimento da agenda nacional como internacional do sujeito cultural.
Havendo talento, formação, organização, matéria-prima, infra-estrutura de produção e comunicação, a qualidade do produto cultural acontece e o mercado da arte aparece, amplia-se e consolida-se.
Em Cabo Verde, temos talento e temos uma rica diversidade cultural. Porém, temos necessidade de mais formação, de mais organização, de mais e melhor acesso ao financiamento, de mais incentivos, de mais infra-estruturas culturais, de mais cooperativismo entre os artistas, de mais investimento público e privado no sector, de instituições culturais com maior e melhor capacidade de reposta.
Não obstante, as dificuldades que a economia da cultura atravessa em Cabo Verde, a cultura, na vertente económica e social, manifesta-se como:
• O elemento que faz a promoção do país no além fronteira; • Um dos produtos que melhor corporizam a singularidade do nosso povo e que por isso constitui uma das maiores atracções turísticas; • O suporte que dá conteúdo à educação; • O elemento que melhor cimenta e realiza a unidade da Nação; • Uma das fontes do bem-estar e da qualidade de vida; • Um dos maiores elos de ligação do território com a diáspora. • A fonte de «externalidades positivas» que fecunda a economia e as relações de produção.
Não foi possível ainda estabelecer o peso da nossa cultura no PIB, o valor da exportação de produtos culturais e o número de emprego que cria, o seu peso na criação da qualidade de vida e na fecundação das relações de produção. O Estudo sobre a Economia da Cultura que se preconiza fazer dará resposta a grande parte dessas interrogações.
É evidente que o peso da cultura no PIB e o número de emprego que cria não são insignificantes se tivermos em conta:
• O número de artistas, na área musical, que actua nos grupos ou individualmente, nas digressões internacionais, nos festivais de praia, nas festas populares, nos restaurantes (no país ou na diáspora), nas celebrações comemorativas, nas campanhas eleitorais... • O número de organizadores, de técnicos e de produtores musicais que têm rendimento do trabalho que fazem.
• O número de actuações de artistas ligados ao teatro e à dança, o número de empregos que cria e o retorno económico que proporciona; • O número de livrarias, estudos de gravações, boîtes e espaços de entretenimento existentes e o volume de negócios que movimentam; • A diversidade da gastronomia caboverdiana e o retorno económico que propicia; • O peso económico da cultura na educação, na investigação e no resgate patrimonial; • O número de artistas plásticos, de fotógrafos e o rendimento que capitalizam; • A diversidade de artesanato existente, o seu volume de negócios e o seu peso na criação de emprego; • A representatividade do turismo cultural na economia nacional e o volume de negócios que decorre da orçamentação e animação de espaços turísticos, empresariais, públicos, religiosos e habitacionais. • O valor económico do recheio e dos serviços de instituições culturais como museu, arquivos históricos, casas de culturas, centros culturais.
Quando o Estudo da Economia da Cultura quantificar o volume de negócio que a cultura gera, o numero de emprego que cria, o peso que tem na externalidade positiva que exerce, na promoção externa do país, no reforço da unidade nacional, no aumento da qualidade de vida, na representação do orgulho nacional no território e na diáspora, nessa altura, ela passará a ser um produto de primeira necessidade, um produto de primeira grandeza, e o seu peso no Orçamento do Estado, bem como o seu lugar na administração do país serão mais representativos.
Enquanto se aguarda pela avaliação económica e social indústria criativas em Cabo Verde, vejamos os
IV DESAFIOS DA ECONOMIA DA CULTURA EM CABO VERDE
Se me pedirem para elencar esses desafios, eu não hesitaria em dizer que eles são vários e, por vezes mesmo, muito complexos, como por exemplo:
• A qualidade do sujeito e do produto culturais, através da formação de curta e de longa duração; • A aproximação da educação da cultura não só para qualificar o sujeito cultural mas também para criar um público consumidor da cultura, porque a entende e porque dela passou a ter fome; • A criação da cultura de organização em todos os domínios de criação cultural e artística; • O desenvolvimento do empreendedorismo cultural e a incubação de empresas no sector da cultura; • O aumento do Orçamento público para a área da cultura; • A criação de mais incentivos e de mais infra-estruturas ao nível das exigências do estádio de desenvolvimento em que nós nos encontramos; • A diversificação e a actualização da legislação cultural; • A valorização e o desenvolvimento do turismo cultural; • A criação de um crédito cultural e de um fundo para a cultura, com uma gestão público – privada; • O desenvolvimento e o engajamento do mecenato cultural; • Admitindo a força da cultura em criar externalidades positivas nas relações de produção, sensibilizar os empresários a aceitarem o desconto de uma percentagem mínima a recair em todos os projectos de investimento, a favor do desenvolvimento cultural; • Acelerar a criação da Agência de promoções cultural; • Exercer uma diplomacia preocupada em fazer a promoção da nossa cultura e em localizar possíveis mercados e fontes de financiamento; • Promover o cumprimento e o respeito pelos direitos de autor;
Em Cabo Verde, depois dos recursos humanos, a cultura é a nossa melhor riqueza. A matéria-prima que a molda e formata é inesgotável e é amigo do ambiente.
O desenvolvimento sustentado de Cabo Verde passa, necessariamente, pela aposta que o país fizer na cultura. Mais do que ouro ou petróleo, ela é a nossa alma e a expressão da nossa singularidade. Ela é também um produto para o mercado, com particular vocação para o aumento do PIB nacional e para a criação de emprego.
O desenvolvimento sustentado de Cabo Verde passa, necessariamente, pela aposta que o país fizer na cultura. Mais do que ouro ou petróleo, ela é a nossa alma e a expressão da nossa singularidade. Ela é também um produto para o mercado, com particular vocação para o aumento do PIB nacional e para a criação de emprego.
Os caboverdianos têm que tomar a consciência deste facto e conferir à cultura o financiamento que merece e que precisa, o tratamento que reclama e merece, a organização que precisa e ambiciona, a qualificação que reclama e deseja, as infra-estruturas que procura e que reclama, a promoção que merece e necessita.
O facto de termos, hoje, a consciência de todos esses desafios é já uma grande parte do caminho andado. A nova aurora da cultura já está no horizonte. Mais do que esperança, tenhamos confiança na própria força propulsora da nossa cultura que, seguramente, levar-nos-á a encontrar soluções para todos os desafios que a sua promoção e valorização reclamam.
Eu confio. Estou certo de que a Nação inteira também está confiante e expectante.
Muito obrigado
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