Irmon Kabuverdianus, Nu Uza Y Divulga Alfabétu Kabuverdianu Ofísial(AK, ex-ALUPEC)

Wednesday, August 13, 2008

O Kriolu Cabo-Verdiano E O Português Numa Dualidade Horizontal





Agnelo A. Montrond


A palavra Kriolu deriva da palavra portuguesa Crioulo, a qual por sua vez deriva do verbo criar e do substantivo olo, cujo significado é: “casa - uma casa africana típica nas antigas colónias portuguesas em África.” A rápida superposição ou seja justaposição das palavras criar e olo explicam a origem dos termos Crioulo e Kriolu.

Os escravos estratégica e deliberadamente criaram o Kriolu como uma lingua com características e estrutura própria e diferente do Português para poderem comunicar entre eles sem que fossem entendidos pelos seus proprietários. Os colonos, obviamente, não acolheram o Kriolu de bom grado porque poderia comprometer os seus poderes absolutos em superiormente controlar a situação escravocrata. Por isso sempre tentaram, mas sem êxito, erradicar a língua materna e a identidade cultural dos cabo-verdianos. Embora seja que essa tentativa tenha surtido o efeito oposto, temos de admitir que algums cabo-verdianos, de diferentes gerações, assimilaram com mestria aquela mentalidade colonial, chegando mesmo ao cúmulo de se considerarem culturalmente superiores à sua própria gente, desprezando os seus próprios valores culturais e identitários. Isto explica parcialmente a resistência correlacionada com a crise de identidade que alguns cabo-verdianos ainda possam estar a enfrentar, a qual precisa urgentemente de ser abordada e solucionada.

Sendo a cultura de um povo o reflexo e o pulsar da sua identidade, devemos estar preparados para entender e efectivamente enfrentar esses tipos de comportamentos bizarros. E isso entende-se porque durante a era colonial, a estratégia consistia também na lavagem cerebral do povo das colónias. De facto, tudo fora direccionado para a cultura dos colonizadores, que alias éra a cultura de facto que os Cabo-verdianos deveriam aprender com mestria. Nas escolas, o currículo refletia aquela politica colonial mal concebida: os estudantes eram obrigados a aprender geografia, língua, história e a cultura dos colonos e estimulados a ignorar o que era próprio deles. Foi assim que tiveram de aprender os nomes de todos os rios e a história de todos os reis de Portugal. Além do mais, tiveram de ler textos saturados pela ideologia dos colonizadores. Essa táctica originou um sentido de inferioridade e complexo de inferioridade na nossa gente, o que ainda está tendo um impacto negativo em alguns de nós.

Durante séculos, qualquer tentativa ou movimento anticolonial era imediatamente reprimido e punido pelas autoridades de então. A imposição do português como a única língua oficial não foi nada mais do que uma atrocidade provisória, sendo que tanto os cabo-verdianos no arquipélago como os da diáspora sempre resistiram natural e espontaneamente a tal iniciativa. O Kriolu surgiu, e continua surgindo, como a língua que definiu e formatou a nossa cultura. Os cabo-verdianos sempre aprenderam o português num contexto académico nas escolas, enquanto os conhecimentos para a sobrevivência e os segredos da vida foram e continuam a ser aprendidos em Kriolu em casa, em locais de divertimentos, etc, através de interacções sociais.

Nos Estados Unidos, os cabo-verdianos são identificados como um grupo bem distinto e separado dos outros; eles não são portugueses, mas sim cabo-verdianos. A sua língua nativa é o cabo-verdiano, não o português. A língua cabo-verdiana é uma língua autónoma com a sua própria estrutura e léxico, que reflectem tanto a influência da língua portuguesa como também de línguas africanas do Oeste. A influência portuguesa é óbvia considerando a natureza lexical da maioria dos vocábulos da língua cabo-verdiana. Entretanto, a influência Oeste Africana parece ser ignorada. Na realidade, o Crioulo cabo-verdiano e algumas línguas do Oeste Africano apresentam muita semelhança e paralelismo: os adjectivos que são colocados depois do substantivo, o uso da entoação Sonora para diferenciar entre frases interrogativas e declarativas, frequente repetição de palavras, estruturas morfológicas africanas, a falta da distinção de voz activa e passiva, adjectivos verbais, etc.

De algum tempo a esta parte, muito tem sido feito em prol da dignificação do crioulo de Cabo Verde: o alfabeto unificado para a escrita do cabo-verdiano, “ALUPEC” foi já aprovado pelo governo de Cabo Verde; vários materiais literários em Kriolu estão disponíveis na internet, em livros, periódicos, textos académicos, e em outras formas. Esses recursos vêm e continuam sendo fornecidos por vários autores incluindo entre outros, o Doutor Manuel Veiga, que é o autor da Introdução à gramática do Crioulo cabo-verdiano, Tomé Varela, Káká Barbosa, Danny Spinola, e Manuel Da Luz Gonçalves, que é o autor do livro Pa Nu Papia Kriolu. No entanto, ainda há mais trabalho por fazer, nomeadamente uma emenda à Constituição da República de Cabo Verde, a qual declara o português como a língua oficial, no sentido de constitucionalmente conferir ao Kriolu o estatuto de língua oficial que tanto merece juntamente com o português. Todavia, não estamos a tentar reinventar a roda quando reclamamos, num tom positivo e construtivo, que o Kriolu cabo-verdiano padece de visibilidade nos Estados Unidos. Nem precisamos de ser cientistas em balística ou génios para apercebermos que o Kriolu ainda carece de reconhecimento em Brockton, a Cidade dos Campeões que acolhe mais de trinta mil cabo-verdianos. Os nossos líderes precisam de ser mais proactivos numa diligência conjunta no sentido de sensibilizar e influenciar o reconhecimento da nossa identidade linguística e desmistificar uma vez por todas o imbróglio: o português ou o Kriolu, qual é a língua nativa dos cabo-verdianos?

Estamos já em tempo oportuno para o empoderamento da expressão natural da alma do cabo-verdiano tanto no arquipélago como nas comunidades na diáspora. O povo cabo-verdiano sempre manifestou a necessidade de um compromisso linguístico equilibrado entre as duas línguas, o Kriolu cabo-verdiano e o português numa relação de dualidade na horizontalidade, como as duas linguas oficiais de Cabo Verde. Estamos esperançosos e cientes que o governo, sobretudo o Ministro que tutela a Cultura, o Doutor Manuel Veiga, em parceria com os parlamentares cabo-verdianos, sabiamente irão agilizar o processo e fazer com que isso aconteça brevemente.

Agnelo A. Montrond

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